sábado, 8 de dezembro de 2012

África do Sul 2012



The Union Buildings - Pretória

No próximo dia 11 de Fevereiro vão completar-se 23 anos sobre a libertação de Nelson Mandela e sobre o início do fim do apartheid. Vinte e três anos não é nada na história de um país, mas quando esse país é a África do sul estes mesmos 23 anos já me parecem uma eternidade. Como é que a África do Sul ainda existe, ou melhor, como é que este país conseguiu existir, reinventar-se, no pós apartheid é uma pergunta que não me canso de fazer a mim mesmo. Uma vez li ( já não me lembro bem onde ) que a queda do apartheid produziu um momento raro na história, por ter coincidido com uma altura de grandes líderes políticos ( com o Nelson Mandela à cabeça ), sem os quais nada seria possível. Como contraponto dava-se o triste exemplo do fim da ex-Jugoslávia,  que um ano depois da revolução sul africana mostraria ao mundo o pior da condição humana. Se houve algum milagre em todo este processo, o milagre foi esse, conseguir reunir no mesmo sitio, no mesmo momento o melhor que o país tinha para oferecer para liderar as diferentes opiniões. Em 1994 Nelson Mandela foi eleito presidente do país e foi em Pretória no Union Buildings, a sede administrativa do governo, que ele fez o discurso de tomada de posse, para uma multidão imensa, multicolor, que encheu todos os recantos do parque.



Nada melhor, então, para comemorar o momento, do que sentar na relva, puxar do caderno, deixar o pincel seguir o seu caminho, abrir os ouvidos para o silêncio dos pássaros e deixar a imaginação fazer o resto.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Marrocos 2011




Marrakech - medina

Os dois últimos desenhos da viagem. O último dia em Marrakech. A última viagem em Marrocos. Os próximos desenhos serão de um novo caderno, de uma nova viagem.

 Marrakech - medina

domingo, 4 de novembro de 2012

Marrocos 2011



Marrakech - Praça Jama al Fna

A praça amanheceu em silêncio. Alguns trabalhadores da limpeza municipal removem os últimos vestígios do bulício da noite anterior, três carros carregam mercadorias, meia dúzia de turistas madrugadores vagueiam meio perdidos em direcção à medina. Daqui a pouco o fresco da manhã dará lugar ao calor abrasador do meio dia e aos cheiros da comida, dos fritos e do escape dos automóveis do fim do dia … e o silêncio de agora será depois varrido pelo barulho dos carros, dos pregões e das conversas. Um movimento perpétuo que todos os dias se repete e todos os dias se renova.

domingo, 28 de outubro de 2012

Marrocos 2011


Praça Jama al Fna - Marrakech

O terraço é a plateia, o chá de menta são as pipocas e a praça Jama el Fna o ecrã. O filme dura o tempo que nós quisermos. É só sentar e desfrutar.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Marrocos 2011


Essaoiura

Últimos momentos  na cidade antes do regresso a Marrakech.

Marrocos 2011


Essaouira


terça-feira, 2 de outubro de 2012

Marrocos 2012



Essaouira

Prepara-se um final de tarde com maré cheia, mar cavado, céu cinzento e o barulho ensurdecedor do vento norte. Todas as forças da natureza em uníssono, numa perfeita harmonia para a grande cerimónia da despedida.

Marrocos 2011


Essaouira

Regresso a Essaouira. O último dia para voltar a repetir os mesmo cantos e recantos, os mesmos becos, ruelas e terraços. Um dos lugares mais mágicos desta medina é a pequena rua junto à muralha portuguesa. Do lado de fora o mar sem fim, com as suas tormentas e a sua fúria, que não se cansa de por à prova a competência da engenharia militar portuguesa quinhentista, do lado de dentro a calma e a tranquilidade de mais um dia na vida da cidade.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Marrocos 2011


Safi


Subindo o emaranhado de ruas chego finalmente ao topo da medina. Safi foi conquistada pelos portugueses em 1508 e abandonada pelos mesmos em 1542. Toda a muralha da medina, o traçado das ruas e das casas são de origem portuguesa, assim como o que resta da antiga catedral e o famoso Castelo do Mar ( que não aparece no desenho). Uma das coisas que mais me fascina na história de Portugal não são propriamente as conquistas mas sobretudo os abandonos. Andar a construir cidades pelo mundo é obra, mas ter, depois, que as abandonar ainda me parece mais grandioso. Passámos cem anos a construir e depois tivemos quatrocentos anos para abandonar tudo, até voltarmos de novo para o nosso pequeno rectângulo à beira mar plantado para fazermos outra vez de conta que somos europeus. 

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Marrocos 2011


Safi - medina


Na altura em que caminho pelo subúrbio fantasma da cidade de Safi em direcção à medina ainda não sei que o autor do terrível atentado de Marrakesh que aconteceu no dia 28 de Abril de 2011, portanto quinze dias antes de ter iniciado esta viagem, é desta cidade, ele e mais os dois outros amigos cúmplices do atentado.
Adil Al-Atmani tinha um sonho que era juntar-se a grupos terroristas na Chechênia e Iraque, mas foi detido por duas vezes em Portugal, em 2004 e 2007, e recambiado para o seu país de origem. Na impossibilidade de conseguir cumprir esse objectivo, optou pela prata da casa e decidiu apontar baterias ao café Argana em Marrakesh, por ser um local frequentado maioritariamente por turistas. Dessa decisão resultaram  os 16 mortos e 21 feridos que todos ainda lembramos.
Entretanto Adil Al-Atmani foi julgado e condenado a pena de morte, juntando-se assim a mais 103 condenados que aguardam pelo cumprimento da mesma pena em prisões marroquinas.

Mas no momento em que começo a percorrer as ruelas da medina ainda nada disto se sabe e por isso a minha atenção está apenas concentrada no que os meus olhos vêem: ruínas da antiga catedral portuguesa, uma teia de ruas e casas em adiantado estado de decadência, crianças com baldes de água à cabeça, pessoas que espreitam de dentro das casas, cães e gatos abandonados a esgravatar restos de comida nos sacos de lixo espalhados pelos cantos, jovens com camisolas do Barcelona e Real Madrid, jovens com outro tipo de camisolas, grupos de jovens aparentemente sem nada para fazer, pequenas e sujas lojas de comércio local com velhos sem dentes atrás de um balcão …

E a viagem continua.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Marrocos 2011


Safi

Apanho o autocarro em Essaouira e três horas depois chego a Safi. Ruas desertas, casas em ruínas, alguma arquitectura colonial muito mal tratada. A sensação de ter chegado a uma cidade fantasma. O Marrocos urbano, profundo, longe dos roteiros turísticos, em todo o seu esplendor dá-me as boas vindas. O sol abrasador e a nortada forte que sopram na costa a esta hora do dia não convidam ninguém a estar na rua, só mesmo eu para contrariar esta pacata e estranha forma de vida. Hoje os habitantes da cidade não se vão poder queixar da falta de turistas.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Marrocos 2011


Café Jimi Hendrix, em Diabat, a casa onde terá vivido o famoso guitarrista, segundo o proprietário do próprio café.


Diabat, é uma pequena povoação, localizada entre as dunas e o mar, a escassos três quilómetros de Essaouira. Enquanto que Essaouira precisou de mais de quinhentos anos de histórias, de guerras, de tesouros e piratas para se impor no mapa, já a Diabat bastaram umas poucas semanas para virar local de culto. A responsabilidade de tal feito é atribuída ao guitarrista Jimi Hendrix que nos idos anos sessenta ali terá passado alguns dias da sua curta existência. O que terá exactamente feito ali o músico é a grande pergunta que falta responder. Para quem ficou realmente curioso não há nada, então, como visitar o local e ouvir as histórias dos seus habitantes contadas na primeira pessoa. Há de tudo para todos os gostos, inclusive histórias contadas por criancinhas de dois anos de idade, com o ranho a escorrer pelo nariz, que juram saber toda a verdade. 


quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Marrocos 2011


A cidade e o mar, o casamento perfeito … e já lá vão mais de quinhentos anos.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Marrocos 2012


Ao largo de Essaouira há rochas, ilhas, enseadas e restos das antigas fortalezas que no passado eram a guarda avançada da defesa da antiga cidade de Mogador. Há gaivotas, pequenos barcos, pescadores, mar e céu azul, cada um com o seu espaço, cada um no seu lugar, todos convergindo para o equilíbrio absoluto da composição final. É tão simples, parece tão fácil.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Marrocos 2011


Pequenos barcos que chegam ao porto de pesca, caixas de peixe que são transportadas em carros, compradores de ocasião, turistas acidentais, de tudo um pouco é possível encontrar nesta hora mágica do dia, em que se fazem os balanços de uma jornada de trabalho. Essaouira nunca se cansa de nos oferecer o melhor que tem.

Marrocos 2011


A praia de Essaouira, ao fim da tarde, a altura em que a nortada se levanta para mostrar toda a sua energia, a mesma energia que há quinhentos anos atrás trouxe as caravelas e as empurrou em direcção ao desconhecido.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Marrocos 2011


Ainda às voltas com o peixe nas docas,  uma espécie de inspiração para o jantar que se aproxima.

Marrocos 2011


O porto de pesca de Essaouira

terça-feira, 19 de junho de 2012

Marrocos 2011


Essaouira


Uma banca de peixe é a melhor natureza morta que se pode desejar (se é que se pode dizer isto desta maneira) e se essa banca for num pequeno porto de pesca, de uma pequena cidade de Marrocos, como é o caso de Essaouira, então temos a imagem perfeita. Há uma lógica e uma decência nesta forma de pesca quase artesanal destas pequenas cidades, que deveriam fazer parte da educação das sociedades. Saber de onde vêm os alimentos ajuda-nos a perceber o quão frágil é esta relação do homem com o meio envolvente. Um pequeno porto de pesca é um pequeno tesouro que nos mostra o melhor que a natureza pode ter para nos oferecer, mas ao mesmo tempo dá-nos a medida exacta do respeito que devemos ter por aquilo que comemos. As coisas valem pelo trabalho que dão e por aquilo que são.
Esta medida exacta do real valor das coisas, que deveria ser óbvia para qualquer pessoa, perde-se completamente nas grandes suprefícies, onde, por via da massificação tudo se banaliza.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Marrocos 2011



Essaouira - venda de peixe, depois da chegada dos barcos, no final do dia.

Essaouira é um dos principais portos de pesca de Marrocos mas é também, e vá lá saber-se porquê, uma cidade com especial vocação para formar artistas. Frédéric Damgaard ( dinamarquês de origem ) que visitou a cidade pela primeira vez nos anos sessenta reparou precisamente nesse facto e terá ficado de tal modo surpreendido com a veia artística dos seus habitantes que vinte anos mais tarde decidiu meter mãos à obra e abrir uma galeria. Ao longo destes últimos anos a galeria Damgaard (http://galeriedamgard.com/ ) criou uma imagem de qualidade extravazando mesmo a sua fama para os quarto cantos do mundo. Muitos foram os artistas que por lá passaram, maioritariamente artistas sem formação académica. Azeddine Sanana é um desses exemplos. Pescador desde sempre, descobriu, por via da galeria, um grande fascínio pelas artes que não sabia existir. Um dia, ao verem o seu genuíno interesse pelos quadros da galeria decidiram dar-lhe pincéis e tintas para que ele desse largas à sua veia artística. Sanana conseguiu ligar, por linhas que só ele sabe, o mundo da pesca com o mundo das artes, e o resultado foram quadros absolutamente desconcertantes. Sanana continua a viver entre esses dois mundos, e sempre que o mar não o convida a desafiá-lo, a pintura abre-lhe todas as portas para outras e diferentes viagens, por mares também e sempre dificilmente navegáveis.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Marrocos 2010



Essaouira



Começamos em Ceuta, bem de frente para a Europa e vamos por ali abaixo: Alcácer Ceguer, Tanger, Arsila, Azemour, Al JAdida ( antiga Mazagão ), Safi, Essaouira ( antiga Mogador ) e Agadir. Entre 1415 e 1769, anos que marcam a conquista de Ceuta e o abandono de Mazagão, viveu-se, guerreou-se, traficou-se e amou-se em português. Foram anos de vitórias e derrotas, de grandezas e misérias, e no fim sempre a mesma conclusão: na vida e na história tudo passa, tudo tem um tempo, tudo tem um preço.

Essaouira parece hoje, finalmente, ter chegado à idade da sabedoria, que é como quem diz, parece ter sabido envelhecer, sem ódios nem rancores nem frustrações. Hoje parece respirar-se paz, harmonia e tranquilidade …  ou será apenas mais um intervalo para o descanso dos guerreiros?

domingo, 3 de junho de 2012

Marrocos 2011



Apanho o autocarro bem cedo em Marrakech e passado duas horas e meia estou em Essaouira. Troca-se o deserto e as montanhas pelo mar, o calor seco pela húmidade salgada e as suaves brisas do fim do dia pela nortada da costa. A antiga Mogador abre-nos as portas para uma viagem pela história, através das suas muralhas, das suas ruelas e das suas fortificações, mas isso ficará para mais tarde. Agora é tempo de ouvir o barulho das ondas do mar a baterem nas pedras da muralha, do assobiar constante do vento e da "vozearia" das gaivotas. Como se costuma dizer em Marrocos, Essaouira define-se numa palavra: relax. 

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Marrocos 2011


Praça Jamaa el Fna.

Todos os autarcas de Portugal deveriam ir pelo menos uma vez na vida a Marrakech e verem com os seus próprios olhos a vida da cidade para tentarem perceber porque é que neste nosso país, e salvo raras excepções, os centros urbanos estão a definhar em lume brando a caminho do mais completo estado vegetal.
A praça Jamaa el Fna é o coração e o ponto de encontro de referência da cidade. Naquele pequeno espaço podemos tomar-lhe o pulso e tirarmos as nossas conclusões. É engraçado perceber que a praça não tem nenhum monumento de relevo, não é especialmente bonita nem tem sequer vistas naturais que possamos referir. No entanto,  à sua volta, todos os terraços e esplanadas se enchem diariamente de pessoas. O que é que torna tão atraente esta praça é a pergunta que fica?
Jamaa el Fna consegue este pequeno milagre que é, reunir num mesmo espaço diferentes actividades, sem que umas choquem com outras. Restaurantes de rua, bancas de comida, vendedores ambulantes das mais diferentes áreas, pequenos espectáculos, turistas de todas as partes do mundo, habitantes da própria cidade, transeuntes e mesmo carros, motas e bicicletas em quantidades equilibradas. É esse fervilhar, essa dinâmica, essa vida que a cidade tem que a torna irresistível para quem ali chega.
Alguém é capaz de imaginar a Praça do Comércio ou o Rossio com este ambiente depois das oito horas da noite?


quinta-feira, 17 de maio de 2012

Marrocos 2011


Marrakech

Uma das grandes imagens de marca de Marrocos, e do mundo árabe no geral, são as suas cidades. A geometria das ruas, a disposição e a arquitectura das casas são para mim um pequeno milagre da engenharia humana. Estamos de tal maneira esmagados pela imposição do automóvel no dia a dia do nosso mundo ocidental que até nos esquecemos do prazer que é podermos ter a rua só para nós, só para as pessoas. A labiríntica malha urbana das medinas árabes têm origens medievais, numa altura em que as cidades eram feitas para as pessoas e à escala das pessoas. A rua era o ponto de encontro de toda a actividade humana e a casa o refugio. O resultado disso são estas espantosas ruelas, com becos, cantos e recantos, sons e silêncios que nos deixam espaço para a vida. Dentro de uma medina vive-se a uma determinada velocidade, fora da medina vive-se dez vezes mas acelerado. Depois temos a casa, essa coisa espantosa que se chama riad, uma verdadeira criação do génio humano. Os riads têm no seu adn o essencial da chamada "vila romana, ou seja um pátio no meio para onde estão voltadas todas as divisões da casa. No pátio existe normalmente uma laranjeira ou limoeiro e um fio de água a correr para um pequeno tanque. O contacto com o exterior fica quase sempre limitado ao terraço, que é o lugar de eleição para descansarmos no final de cada dia. Os materiais usados ( a taipa e a cal ) são as outras peças importantes desta complexa e ao mesmo tempo simples engrenagem que são os riads. As paredes grossas e a disposição das divisões possibilitam uma temperatura equilibrada no interior das casas deixando-as imunes aos calores sufocantes do verão ou ao terrivel frio dos invernos.
Acordar bem cedo e abrir a porta do quarto para deixar entrar o chilrear dos pássaros, ou adormecer ao som de um fio de água a cair no tanque do pátio. Entre estas duas maldades que venha o Diabo e escolha.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Marrocos 2011



A Koutubia é ainda hoje o edifício mais alto de Marrakech, mas mais do que isso continua a ser o verdadeiro símbolo da cidade.
Ao fim da tarde, quando o pôr-do-sol faz explodir toda a gama de tons alaranjados dos edifícios, a cidade atinge o seu ponto mais alto.  O chilrear estridente dos pássaros mistura-se com a agitação das ruas e com a suave brisa que desce das montanhas para se juntarem todos numa espécie de celebração à vida. A koutubia, do alto da sua história vai observando a cidade. A noite começa a cair, a cidade começa a despertar.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Marrocos 2011


Praça Foucauld a meio caminho entre a praça Jama el Fna e a Koutubia.
Acordar cedo para aproveitar o fresco da manhã, o silêncio da medina e o chilrear dos pássaros. Quando o sol se levantar e o calor apertar a sério procuraremos uma sombra e um chá de menta e deixaremos o tempo passar lentamente até o final da tarde nos devolver de novo o melhor da cidade.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Marrocos 2011


Praça Jama el Fna, em Marrakech.


Quinze dias depois de um atentado terrorista ter morto dezasseis pessoas em Marraquech, a praça parece querer voltar a respirar a mesma calma e tranquilidade que sempre a caracterizou. Os encantadores de serpentes, os aguadeiros, os contadores de histórias, os malabaristas, os músicos e os turistas voltam de novo a ocupar um espaço que é seu por excelência, tentando reagir  à onda de medo generalizado que naturalmente daí resulta. O terrorismo é a chaga da nossa sociedade, não só porque mata, mas principalmente porque nos contamina com doses maciças de medo, e o medo é o maior inimigo da vida. As marcas do atentado ainda estavam bem visíveis na destruição parcial de um dos cafés mais emblemáticos da praça Jama el Fna, o café Argana, mas preferi concentrar a minha atenção noutros pormenores bem mais emblemáticos da vida da praça.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Marrocos 2011


Hotel La Mamounia, em Marrakech.


Este desenho do famoso hotel La Mamounia, em Marrakech, dá início a este novo caderno. Em 2011 voltei a Marrocos, um regresso que começa já a ser um hábito mas sobretudo um tónico para a alma. Tão perto de Portugal e tão diferente. Bastam duas horas e meia de viagem para que de repente quase tudo mude. Chegar a Marrakech por volta das 15 horas é perfeito e dá-nos o tempo suficiente para sentirmos os primeiros bafos de calor vindos do deserto, para nos dirigirmos ao centro da cidade e nos instalarmos confortavelmente num dos muitos riads que existem à nossa disposição dentro da medina. Há ainda tempo suficiente para nos dirigirmos depois à praça Jama el Fna e tranquilamente, enquanto a hora do jantar não chega, disfrutar de um tradicional chá de menta. Aos poucos a praça começa a fervilhar de gente e de atividade. O cheiro da comida mistura-se com o som dos músicos, o barulho das motas, o pregão dos vendedores de água, e as vozes dos encantadores de serpentes e dos contadores de histórias. De repente tudo na praça é vida, como se numa fracção de segundo acordasse da letargia e indolência provocada pelo calor abrasador do dia. Paul Bowles dizia que a cidade de Marrakech é sobretudo a sua praça. “Tirem a praça à cidade e não sobra nada”.  Eu acrescentaria: é a praça e mais o La Mamounia. O hotel trouxe à cidade a possibilidade de se misturarem no mesmo sitio dois mundos diametralmente opostos.  Uma mistura que passou, no fundo, a ser a imagem de marca da cidade. Desde 1923, data da sua construção, que o hotel não mais parou de receber pessoas dos quatro cantos do mundos, sendo talvez Winston Churchill aquele que mais lhe está associado. Recentemente encerrou para obras, reabrindo em 2009, três anos depois, com um novo conceito de luxo mas com o mesmo glamour de sempre. Visitar hoje o hotel não é fácil mas é possível, mediante prévia marcação e vale mesmo a pena porque é uma viagem no tempo e na história.
Mas entretanto a noite cai, e podemos então começar a pensar no jantar: umas azeitonas, polpa de tomate, azeite e orégãos com pão, como entrada, a seguir uma salada mediterrânica e uma tagine de borrego, depois é deixar o tempo passar, só isso. É tão simples não é?



domingo, 1 de abril de 2012

Istambul 2011



Estação de comboios de Istambul


Quase todas as cidades têm os seus mitos e as suas histórias. Alguns flutuam no ar e respiram-se logo à saída do avião, outros estão presentes em coisas tão simples como uma pedra ou uma árvore. A estação de comboios de Istambul assim como o clássico hotel Pera, não são propriamente coisas simples e discretas na sua volumetria, antes pelo contrário, estão certamente na categoria dos grandes monumentos da cidade, mas acredito que já quase ninguém lhes dê a importância que tiveram num passado recente. Estes dois edifícios esbatem-se hoje um pouco na paisagem acelerada da cidade, fazendo um esforço para exibir bem alto os galões da sua história. É impossível dissociá-los apesar da relativa distância geográfica que existe entre os dois. A estação foi construída para ser o destino final do mítico Expresso do Oriente, na Europa, e o Hotel Pera Palace o local onde se alojavam os seus passageiros mais abastados, numa altura em que chegar a Istambul, via Paris, era entendido verdadeiramente como uma “viagem” e não uma passagem, como hoje, onde nos atropelamos a correr nos aeroportos com os olhos sempre postos num ecran, de um qualquer computador, de um ipod, ipad, iphone. O tempo de uma viagem era também um tempo para se viver, e quando a vida não cabia na própria realidade inventavam-se “outras vidas” e “outras realidades”.
Sobre este mítico comboio existem seguramente uma boa mão cheia de livros, filmes e documentários, que fizeram dele um dos comboios mais famosos do mundo, mas bastaria apenas um livro para o imortalizar. O “Crime no Expresso do Oriente”, que Agatha Christie terá escrito no alegado quarto 411 do Pera Palace Hotel ( será verdade?) foi mais um dos seus inúmeros livros que na altura a ajudaram a criar um fenómeno literário à escala global ( com mais de dois mil milhões vendidos na sua totalidade até hoje ). Sem ele a escritora não ficaria nem mais pobre nem menos famosa, mas seguramente que nem a estação nem o hotel seriam hoje recordados da mesma forma se este livro não tivesse sido escrito.

Estes dois desenhos que fecham o caderno de Istambul devem particularmente a sua existência ao facto de, tanto a estação como o Pera Palace Hotel se terem tornado verdadeiras lendas vivas, quanto mais não seja no meu imaginário. Fica assim registada esta minha divida para com o livro e a sua autora no último post deste caderno.

No próximo caderno regresso a Marrocos, um regresso sempre desejado e festejado.